Pequenos e médios empresários com negócios estruturados e lucrativos e capacidade para expandi-los optam por não aumentar suas operações de olho em um maior controle da operação.
Sem estar no dia a dia da operação, há o receio de não conseguir prover aos clientes um serviço de qualidade, personalizado. Experiências malsucedidas de tentativa de expansão no passado também entram na lista de motivos.
A Casa Santa Luzia, empório que existe nos Jardins desde 1926, é um desses casos. A empresa é administrada pela terceira geração da família fundadora e, embora clientes peçam e investidores já tenham oferecido viabilizar uma ampliação da operação, com a abertura de novas lojas, não pretende ter outra unidade além da única existente, que fica na alameda Lorena.
"Nosso modelo é muito próximo do cliente, do fornecedor e do funcionário. Nós temos uma fábrica no prédio e também recebemos as mercadorias aqui, não num centro de distribuição. Isso seria impossível de repetir com mais lojas. Não teria a agilidade para supervisionar tudo que tenho aqui", afirma Ana Maria Lopes, 62, diretora da casa e neta de seu fundador.
Ela ressalta que é preciso buscar formas de atingir o cliente que não pode ir sempre e à loja, mas sem "perder a essência e os princípios". Durante a pandemia, a Santa Luzia expandiu seu delivery, que, conta Ana, é personalizado.
"O cliente que gosta da carne cortada de tal jeito pode pedir exatamente o mesmo no delivery", afirma.
Ela diz ainda que, em alguns momentos, grandes redes de supermercado já buscaram conversar com a Santa Luzia para parcerias e, eventualmente, incorporação.
"Mas eles têm consciência que a gente, sendo uma empresa familiar, consegue fazer muitas coisas que eles não conseguem, e vice-versa."
A Santa Luzia, que não revela faturamento, emprega 650 pessoas. Todas no mesmo endereço.
Em Assis, no interior paulista, a empresária e farmacêutica Priscila Prado, 50, pensa de forma semelhante sobre seu negócio, a farmácia de manipulação Artesanal Botica, que existe há 15 anos.
"Tenho todas as condições de abrir outras unidades. Não precisaria nem de investidor, mas optei por trabalhar de maneira artesanal, no olho no olho, e em apenas um ponto."
Segundo ela, as entrevistas individuais antes de sugerir uma fórmula para o cliente fazem a diferença, e o modelo não poderia ser mantido caso ela tivesse várias lojas.
Priscila conta ainda que sofre pressão de seus clientes para operar em suas cidades natais. "Muita gente que não é daqui para na farmácia, adora e fica dizendo para eu abrir em outros lugares", diz. Ela estima que entre 10% e 15% de seus clientes sejam de fora da região de Assis.
Ela já até tentou fazer a marca crescer, montando uma espécie de franquia na vizinha Tarumã, mas a experiência, em 2018, não deu certo. "Isso me mostrou de uma vez por todas que eu não deveria expandir", afirma.
A empresária conta que ainda busca uma maneira de levar o seu atendimento artesanal para o mundo digital, para chegar a mais clientes sem perder sua essência.
A Artesanal Botica tem 12 funcionários e fatura em torno de R$ 140 mil por mês.
Já Vandir de Andrade Junior, 40, conhecido como Junior Petar, dono do glamping (termo emprestado do inglês que mistura as palavras "glamour" e "camping") Mangarito, na cidade de Iporanga, no interior paulista, diz que, apesar de identificar possibilidades de expansão, prefere prover um serviço bom e individualizado com só 12 apartamentos dentro do Petar, parque estadual no Vale do Ribeira.
"Há muitos parques passando por concessão, e a proposta de um glamping não é invasiva, é de baixo impacto. Então existem muitas oportunidades", diz ele.
"Mas aí eu pensei que aqui já atingi um patamar sustentável. Sempre morei por aqui e estou muito satisfeito com a operação. Não tem por que querer abrir em outros locais", completa.
Segundo Junior, seu objetivo, de trazer um outro tipo de público, mais exigente, ao Vale do Ribeira, já foi conquistado.
"Meu crescimento não é em tamanho, mas em se reinventar e prover novos serviços aos hóspedes. Já temos spa, piscina e uma gastronomia muito boa. Temos quase um funcionário por quarto", afirma.
O Mangarito, que existe desde 2014, emprega dez pessoas e fatura entre R$ 80 mil e R$ 90 mil mensalmente.
Rubens Massa, professor do centro de empreendedorismo e novos negócios da FGV, lembra que a lógica do muito comentado mercado das startups e das grandes corporações, de busca constante do crescimento, não se aplica à grande maioria dos negócios do país.
"O Brasil é o país do mundo com mais empresas familiares proporcionalmente. São 9 em cada 10. Esse modelo pressupõe uma segurança nas operações, uma lógica de centralização e uma simbiose entre os valores da família e da empresa", afirma.
Ele diz ainda que, se o modelo funciona por um lado, mantendo conforto e tranquilidade, os empreendedores devem ficar atentos para não se acomodarem.
Passar por problemas, afirma ele, é um excelente mecanismo para rever e, então, otimizar processos.
Fernanda Bueno, consultora do Sebrae, vê ainda um outro motivo para algumas empresas não quererem aumentar sua operação.
"Muitas têm dificuldades para desenvolver lideranças em que confiem. Se você abre uma unidade em outro local, precisa disso muito bem estruturado, e nem sempre quem tem habilidades técnicas e é bom funcionário vai conseguir ser um bom gestor".